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Reconhecimento de Estados no Direito Internacional

Uma grande multidão se reúne em Viena para celebrar a independência do Kosovo. Em primeiro plano, uma estátua de bronze de uma figura montada empunhando uma espada é visível. O fundo apresenta um palco com faixas dizendo “Kosova e Pavarur”, “Obrigado, EUA”, “Obrigado, UE”, “Obrigado, Áustria” e “Obrigado, OTAN” em vários idiomas, cercado por numerosas bandeiras albanesas e pessoas segurando placas e bandeiras.
Uma celebração da independência do Kosovo em Viena. Kosovo permanece com reconhecimento internacional limitado até hoje. Imagem de Tsui, sob licença CC BY-SA 3.0.

O reconhecimento de um Estado é o ato unilateral pelo qual sujeitos do Direito Internacional — principalmente outros Estados e organizações internacionais — reconhecem a presença dos critérios de estatalidade em uma entidade.

Esse ato não deve ser confundido com o surgimento real de um Estado, que ocorre assim que uma determinada entidade possui os seguintes elementos: uma população permanente; um território definido; um governo; e a capacidade de entrar em relações com outros Estados. De acordo com o Direito Internacional consuetudinário, Estados que possuem esses elementos possuem direitos e obrigações fundamentais internacionalmente, como o direito à soberania e a navegar pelos altos mares, independentemente de serem reconhecidos por outros. Em teoria, presume-se que todos os Estados membros das Nações Unidas possuem os critérios de estatalidade, e o status de outros Estados potenciais deve ser decidido caso a caso.

Assim, a importância do reconhecimento de um Estado não reside necessariamente em determinar se um país existe ou não, mas sim em permitir que outros países se engajem em relações com o Estado reconhecido. O ato de reconhecer um Estado geralmente possui os seguintes significados:

  • Indica que os países reconhecedores desejam estabelecer relações diplomáticas formais com o Estado reconhecido, abrindo caminho para a concessão de imunidades diplomáticas e a conclusão de tratados bilaterais.
  • Mostra que os países reconhecedores acreditam que o Estado reconhecido possui todos os elementos de um Estado. Em situações incertas, o reconhecimento por um Estado serve como uma afirmação de como esse Estado vê o status de uma nova entidade, o que pode influenciar percepções e relações internacionais. Em particular, quanto mais reconhecimentos um Estado recebe, mais forte se torna sua reivindicação à estatalidade. Por exemplo, apesar de não ser membro das Nações Unidas, a Palestina tem bons argumentos para afirmar que é um Estado, pois reuniu um número significativo de reconhecimentos internacionais.
  • Impede que os países reconhecedores deixem de reconhecer a estatalidade do Estado reconhecido. Isso ocorre porque o ato de reconhecimento não pode ser revogado, a menos que os elementos que caracterizam um Estado deixem de existir.

As Teorias Declaratória e Constitutiva

O reconhecimento de Estados no Direito Internacional é regido por duas teorias principais:

  • A teoria constitutiva, prevalente até o século 20, postula que um Estado torna-se sujeito do Direito Internacional apenas quando é reconhecido por outros Estados. Essa abordagem sugere que a existência e os direitos de um novo Estado dependem do reconhecimento dos Estados existentes. Entretanto, essa teoria também implica que um Estado não reconhecido, que pode preencher todos os outros critérios de estatalidade, não está vinculado ao Direito Internacional, como a proibição de agressão. Isso pode acarretar complexidades, especialmente quando um Estado é reconhecido por alguns países, mas não por outros, o que suscita questões sobre seu status jurídico limitado no cenário internacional.
  • A teoria declaratória postula que a existência de um Estado é uma realidade objetiva que não depende de seu reconhecimento por outros Estados. Argumenta que um novo Estado adquire capacidade jurídica internacional através de sua própria situação factual, como governança efetiva e controle sobre seu território, em vez de através do reconhecimento formal de outros Estados. Essa teoria está alinhada com o pensamento legal positivista, porque enfatiza a autonomia dos Estados e a ausência de uma autoridade superior nas relações internacionais. Segundo esta teoria, o reconhecimento de um Estado tem efeitos retroativos, reconhecendo sua existência desde o momento de sua formação.

Em essência, a teoria constitutiva se inclina para os aspectos comunitários da governança internacional, enquanto a teoria declaratória favorece a soberania do Estado.

O estudioso britânico Hersch Lauterpacht tentou aprimorar a teoria constitutiva ao propor que os Estados têm a obrigação de reconhecer entidades que atendam aos critérios internacionais de estatalidade. Essa visão deriva da ausência de uma autoridade internacional central para conferir status legal, atribuindo assim esse papel aos Estados individuais em nome da comunidade internacional. Segundo Lauterpacht, o reconhecimento é tanto um ato declaratório quanto constitutivo — pois reconhece a conformidade da entidade com os critérios de estatalidade e representa a aceitação oficial da referida entidade na comunidade internacional, com plenos direitos e obrigações.

Todavia, um problema com a teoria de Lauterpacht é que o ato de reconhecimento é frequentemente usado pelos Estados para expressar apoio político ou dissidência em relação a outros Estados. Se sua teoria fosse adotada, um Estado não reconhecido poderia potencialmente exigir reconhecimento, suscitando questões complexas sobre a execução de tais demandas contra Estados que escolhem não reconhecê-lo.

De qualquer forma, a abordagem de Lauterpacht não foi adotada na prática dos Estados. A teoria declaratória parece ter prevalecido ao longo do último século, porque os Estados geralmente não negam a existência de direitos e obrigações legais a Estados não reconhecidos. Em vez disso, considera-se que eles estão vinculados ao Direito Internacional, independentemente de seu reconhecimento. Isso foi notavelmente evidente no não-reconhecimento de Israel pelos Estados árabes: apesar das disputas políticas, entendia-se que Israel estava sujeito às normas do Direito Internacional como qualquer outro Estado.

Condições Gerais para o Reconhecimento de Estados

De acordo com a prática internacional contemporânea, quatro requisitos-chave devem ser atendidos para o reconhecimento de um Estado:

  1. Uma entidade só pode ser reconhecida como Estado se possuir os critérios fundamentais de estatalidade.
  2. Um Estado deve ter o desejo de reconhecer outra entidade como Estado.
  3. A entidade reconhecida como Estado deve plausivelmente ser um Estado.
  4. A entidade reconhecida como Estado não deve ter sido estabelecida através de violações graves do jus cogens.

Primeiramente, é bastante evidente que uma entidade só pode ser reconhecida como Estado se possuir os critérios de estatalidade. No entanto, deve-se notar que a não-reconhecimento de um Estado não implica necessariamente a ausência dessas características — afinal, pode haver outras razões para não reconhecimento.

Também, um Estado deve ter o desejo de reconhecer outra entidade como Estado, porque o ato de reconhecimento de Estado é contingente a considerações políticas. Os Estados geralmente retêm a discrição para reconhecer novas entidades, e não são universalmente obrigados a conceder reconhecimento. Isso é evidente em vários contextos históricos, como a recusa de alguns países em reconhecer Estados comunistas ou Israel. A natureza discricionária do reconhecimento foi reforçada pela Comissão de Arbitragem da Iugoslávia, que afirmou que o reconhecimento é um ato voluntário que os Estados podem exercer com base em seu julgamento, sujeito às normas legais internacionais. Na prática, não existe uma norma internacional que obrigue um país, contra sua vontade, a reconhecer outro Estado.

Além disso, a entidade reconhecida como Estado deve plausivelmente ser um Estado, para evitar os problemas que surgem do reconhecimento prematuro de um Estado. Por exemplo, quando a Nigéria alcançou sua independência, uma parte do país chamada Biafra se separou dela e, durante a guerra civil subsequente, ocorreram uma série de violações dos direitos humanos. Alguns países africanos reconheceram o Estado de Biafra, numa tentativa de vinculá-lo às normas internacionais de direitos humanos e responsabilizá-lo por suas transgressões. A Nigéria condenou esses atos de reconhecimento e acabou vencendo a guerra. Isso trouxe um dilema legal: quem seria responsável pelas violações — a Nigéria ou o Estado extinto de Biafra? Além disso, poderiam os outros Estados africanos ser acusados de interferir nos assuntos internos da Nigéria por causa de seu reconhecimento do Estado de Biafra?

Hoje em dia, a criação de novos Estados resulta invariavelmente na perda de território de um país existente. Assim, o ato de reconhecer um Estado exige um equilíbrio entre os princípios da integridade territorial e da autodeterminação. De acordo com o Direito Internacional, um novo Estado só pode ser formado quando uma minoria de pessoas, cultural ou etnicamente distinta do restante da população de um país, luta por independência política. Neste caso, a autodeterminação prevalece sobre a integridade territorial. O reconhecimento de um Estado nesses casos requer evidências claras de que a minoria alcançou a independência, seja através de vitória militar sem suporte externo, seja pelo reconhecimento de independência pelo Estado do qual fazia parte. Contudo, quando uma população não está sujeita a colonização, ocupação estrangeira ou violações graves dos direitos humanos, ela possui apenas o direito à autonomia, não à independência.

Finalmente, o quarto e último requisito para reconhecer um Estado é que ele não deve ter sido estabelecido através de violações graves do jus cogens. Se tais violações ocorreram, embora o Estado tenha direitos e obrigações internacionais, seu reconhecimento por outros Estados é proibido. Na década de 1930, por exemplo, os Estados Unidos não reconheceram a anexação da Manchúria pelo Japão por meio da força, em linha com a Doutrina Stimson. Outro caso são as resoluções do Conselho de Segurança das Nações Unidas que proíbem o reconhecimento de certos Estados, como a Rodésia do Sul (1965), a República Turca do Norte de Chipre (1983) e a Republika Srpska (1992), devido a violações de normas internacionais.

A situação no Kosovo também exemplifica as complexidades do reconhecimento. Após a administração da ONU e uma proposta rejeitada para a independência supervisionada internacionalmente, o Kosovo declarou independência em 2008. Isso levou a reações internacionais divididas, com apoio significativo dos Estados Unidos e da maioria dos membros da União Europeia, enquanto países como Rússia, Sérvia, Espanha e Grécia se abstiveram de reconhecê-lo. Essa divisão impede que o Kosovo se junte à ONU, devido aos poderes de veto detidos pela Rússia. Os Estados que reconhecem o Kosovo lhe concedem os direitos e responsabilidades da estatalidade, enquanto aqueles que não o fazem negam-nos, mantendo seu status internacional como contencioso.

Outras Diretrizes para Reconhecimento de Estados

A comunidade internacional tende a adotar uma abordagem pragmática que se situa em algum lugar entre as teorias declaratória e constitutiva, porque o reconhecimento de um Estado é frequentemente influenciado por considerações políticas.

A postura dos Estados Unidos sobre o reconhecimento de Estados foi destacada durante um debate do Conselho de Segurança sobre o Oriente Médio em 1948. O governo americano afirmou que o reconhecimento é uma decisão soberana, ressaltando que nenhum poder externo deve influenciar as políticas de reconhecimento de um país. O Departamento de Estado dos EUA, por exemplo, especifica que o reconhecimento é contingente a certas condições factuais, como o controle efetivo sobre um território e população definidos, a presença de um governo funcional, e a capacidade de se engajar em relações exteriores e cumprir obrigações internacionais.

De modo semelhante, o Reino Unido geralmente estende o reconhecimento quando está convencido de que um novo governo atende a certos critérios: o controle efetivo e a governança de um território claramente definido, a probabilidade de controle duradouro sobre ele, e a independência externa, juntamente com considerações sobre resoluções relevantes das Nações Unidas.

As práticas recentes evoluíram para considerar os direitos humanos e outros fatores relacionados ao reconhecer novos Estados. A Comunidade Europeia, em 16 de dezembro de 1991, estabeleceu diretrizes enfatizando a importância da adesão à Carta das Nações Unidas, ao Ato Final de Helsinque e à Carta de Paris. Além disso, exigem a resolução de disputas de sucessão de Estados e regionais por meio de acordos, incluindo arbitragem, se necessário. Segundo as diretrizes europeias, uma entidade só pode ser reconhecida por outros como Estado se cumprir uma série de princípios:

  • O Estado de direito.
  • Democracia.
  • Direitos humanos, especialmente os direitos das minorias.
  • A inviolabilidade das fronteiras alcançável apenas por meios pacíficos.
  • Compromissos com o desarmamento e a não-proliferação nuclear.

Deve-se observar que essas diretrizes apenas estipulam requisitos para reconhecer um Estado, em vez de condições para determinar a existência de um Estado. Por essa razão, Estados que eventualmente violem essas normas podem ser responsabilizados por suas ações, mas violações não resultariam necessariamente na retirada do reconhecimento por outros Estados.

Durante a dissolução da Iugoslávia, os europeus colocaram essas diretrizes em prática como condições para reconhecer as repúblicas iugoslavas como Estados independentes. Uma parte essencial deste processo foi a exigência de que essas repúblicas não tivessem reivindicações territoriais contra Estados vizinhos. Os Estados Unidos, embora alinhados com esses princípios, adotaram uma abordagem menos rigorosa, salientando compromissos com a segurança nuclear, democracia e mercados livres.

Conclusão

O reconhecimento de Estados é um processo multifacetado. Ele envolve tanto o reconhecimento de que uma certa entidade atende aos critérios básicos de estatalidade quanto a intenção de aceitar as consequências legais desse reconhecimento, como a concessão de imunidades diplomáticas. O reconhecimento não é meramente um ato passivo, mas sim um ato decisivo, frequentemente discricionário por parte dos Estados, destacando seu consentimento ao status legal de uma entidade e as implicações legais que isso acarreta. Esse processo, marcado por sua natureza complexa e variável, reflete a interação de considerações legais, políticas e éticas nas ações internacionais dos Estados.


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