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Rio-92: Antecedentes, Participantes e Resultados

Foto panorâmica de um grande auditório durante a Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento em 1992, no Rio de Janeiro. O evento mostra um palco com diversos representantes, majoritariamente homens, sentados atrás de mesas com microfones e placas de identificação. No centro, um homem está falando ao púlpito. A audiência é composta por uma grande quantidade de delegados sentados, prestando atenção ao discurso.
Discurso na Conferência Rio-92, que consagrou o conceito de desenvolvimento sustentável. Imagem por autor desconhecido, sob licença CC BY-SA 4.0.

A Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento, mais conhecida como Rio-92, Eco-92 ou Cúpula da Terra, foi um marco na história das políticas ambientais globais. Ela foi realizada entre os dias 3 e 14 de junho de 1992, na cidade do Rio de Janeiro, no Brasil. Esse evento reuniu representantes de todo o mundo para discutir e formular estratégias que promovessem um desenvolvimento que respeitasse os limites naturais do planeta. A conferência foi organizada pela Organização das Nações Unidas (ONU) e é considerada até hoje a maior conferência ambiental já realizada.

A escolha do Rio de Janeiro como sede não foi aleatória. Na verdade, refletiu a crescente importância dos países em desenvolvimento na liderança das discussões sobre o meio ambiente e o desenvolvimento. A Rio-92 aconteceu em dois locais principais: o Riocentro, na Zona Oeste, e o Fórum Global no Aterro do Flamengo, na Zona Sul. O Riocentro foi transformado em um pequeno centro urbano, equipado com segurança reforçada e serviços médicos para os participantes, enquanto o Fórum Global funcionou como um espaço para a ampla participação da sociedade civil, com milhares de ONGs envolvidas.

Um dos principais focos da conferência foi a solidificação do conceito de desenvolvimento sustentável. Esse conceito chama a atenção para a necessidade de uma economia que não apenas fomente crescimento, mas também que preserve os recursos naturais do planeta para as gerações futuras.

A Rio-92 colocou em pauta uma série de questões ambientais essenciais, incluindo a relação entre pobreza e meio ambiente, mudanças climáticas, biodiversidade, combate ao desmatamento, preservação da água, transporte alternativo, turismo ecológico e políticas de reciclagem. Ela acarretou a produção de alguns documentos, a criação de alguns órgãos, e a difusão de um pensamento mais favorável à preservação do meio ambiente.

Antecedentes da Rio-92

Os antecedentes históricos da Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento refletem uma evolução significativa no pensamento ambiental global. Até a década de 1970, a percepção predominante era de que os recursos naturais eram inesgotáveis e poderiam ser explorados indefinidamente para fomentar o crescimento econômico. Essa visão, no entanto, começou a ser questionada à medida que os impactos negativos da industrialização e do uso descontrolado de recursos se tornaram evidentes.

A mudança de perspectiva em relação ao meio ambiente e ao desenvolvimento sustentável começou a ganhar força com a publicação do Relatório “Limites para o Crescimento” (Limits to Growth), em 1972. Esse documento, também conhecido como Relatório Meadows, foi endossado pelo Clube de Roma, um grupo de pensadores e líderes influentes, que havia sido fundado em 1968. Em linha com o neomalthusianismo, ele argumentava que o crescimento econômico contínuo era insustentável, porque os recursos naturais são limitados. Segundo o relatório, o esgotamento desses recursos poderia ter consequências devastadoras para a humanidade.

Esse debate sobre como equilibrar crescimento econômico com sustentabilidade levou à realização da Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano (CNUMAH), em 1972, em Estocolmo, na Suécia. A Conferência de Estocolmo foi o primeiro grande encontro da ONU focado no meio ambiente. Ela revelou um confronto entre duas visões principais:

  • O preservacionismo, que defendia a intocabilidade dos recursos naturais, sustentando que eles deveriam ser preservados mesmo que isso significasse zero crescimento econômico e populacional.
  • O conservacionismo, que advogava pelo uso dos recursos naturais de forma consciente e disciplinada, garantindo tanto o desenvolvimento humano quanto a conservação dos recursos naturais.

Durante a Conferência de Estocolmo, também foi introduzido o conceito de ecodesenvolvimento pelo canadense Maurice Strong, secretário-geral da conferência. Esse conceito propunha um modelo de desenvolvimento que considerasse as necessidades ecológicas e fornecesse uma alternativa à exploração desenfreada de recursos da natureza.

Três homens, dois deles segurando certificados, posam para uma foto. O homem à esquerda, um indivíduo negro vestido em um terno escuro, segura um certificado fechado. O homem do meio, de ascendência asiática e usando óculos, segura um certificado aberto com o título 'Only One Earth' e um logo do globo terrestre. O homem à direita, caucasiano e de cabelo claro, segura uma pasta enquanto posa junto aos outros. Eles estão em uma sala com um quadro ao fundo.
O documento final da Conferência de Estocolmo, de 1972. Imagem de domínio público por UN Photo/Teddy Chen.

O avanço subsequente na discussão sobre desenvolvimento sustentável veio com a publicação do Relatório Brundtland em 1987, intitulado “Nosso Futuro Comum”. Esse relatório foi elaborado pela Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, que era presidida pela norueguesa Gro Brundtland. Ele definiu o conceito de “desenvolvimento sustentável” como aquele que atende às necessidades da geração presente sem comprometer a capacidade das gerações futuras de atenderem as suas próprias necessidades. Os três pilares fundamentais desse conceito seriam:

  • O crescimento econômico (desenvolvimento).
  • A inclusão social (justiça social).
  • A proteção ambiental (conservação dos recursos naturais).

Essa evolução no pensamento global preparou o terreno para a Rio-92, um encontro que foi realizado em comemoração aos 20 anos que se haviam passado desde a Conferência de Estocolmo.

Participantes da Rio-92

A Rio-92 foi um evento de proporções históricas em termos de participação internacional. Ela contou com a participação extraordinária de 179 países, incluindo a presença de mais de 100 chefes de Estado e de governo. Essa ampla participação deixava claro o reconhecimento global da urgência das questões ambientais e da necessidade de cooperação em prol do meio ambiente.

Durante a Conferência, o Brasil esteve sob os holofotes internacionais, mas não apenas por ser o país anfitrião. Na verdade, naquela época, o Brasil vivenciava um contexto ruim para a preservação da natureza, tendo em vista o assassinato do ativista Chico Mendes em 1988, e o início do monitoramento, via satélite, do desmatamento na Amazônia — o qual alcançava grandes proporções.

Todavia, o Brasil adotou uma postura proativa, em contraste com a posição mais resistente de países como os Estados Unidos, liderados na época pelo presidente George H. W. Bush, conhecido como “Bush pai”. O governo brasileiro rejeitou uma proposta do presidente francês Nicolas Sarkozy de criar uma organização ambiental dedicada dentro da ONU. Para a diplomacia brasileira, as questões ambientais deveriam ser tratadas conjuntamente com o desenvolvimento sustentável, enfatizando uma abordagem integrada que não segregasse o meio ambiente de outras questões de desenvolvimento. Graças à atuação do Brasil na Rio-92, o país ganhou imenso destaque internacional e passou a ter credibilidade no âmbito da diplomacia ambiental.

Além dos Estados, a Rio-92 viu uma participação sem precedentes de organizações internacionais e agências regionais. Estas entidades, compostas por Estados, desempenharam papéis cruciais, fornecendo dados e conhecimentos técnicos para as negociações e para a formulação de políticas.

As organizações não governamentais (ONGs) também tiveram um papel destacado na Rio-92, representando uma ampla gama de grupos da sociedade civil de todo o mundo. Milhares de ONGs participaram, trazendo consigo as vozes de comunidades locais, grupos indígenas, ambientalistas e muitos outros, que não costumam ser ouvidos em debates internacionais. Essas entidades contribuíram para ampliar o escopo das discussões, trazendo novas perspectivas e experiências, e para pressionar os governos a adotarem posturas mais firmes e comprometidas com o meio ambiente.

Resultados da Rio-92

A CNUMAD ou Rio-92 gerou uma série de documentos, acordos e órgãos que têm sido fundamentais para as políticas de sustentabilidade global. Estes foram os principais resultados da Conferência:

  • Declaração do Rio sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento: Ela inclui 27 princípios orientadores para o futuro do desenvolvimento sustentável. Seu Princípio Sete, por exemplo, trata do conceito de “responsabilidades comuns, porém diferenciadas”. Segundo ele, embora todos os países sejam responsáveis pela proteção ambiental, os países desenvolvidos têm uma maior obrigação de liderar os esforços globais devido à sua maior capacidade financeira e tecnológica e ao seu histórico de maior poluição. Outra ideia importante desse documento é o Princípio Quinze, que introduz a noção de precaução. Segundo ele, falta de certeza científica absoluta não deve ser usada como razão para adiar medidas que possam prevenir danos ambientais potencialmente graves ou irreversíveis.
  • Declaração de Princípios sobre Florestas: Ela foi uma declaração de intenções relativa à gestão, à conservação e ao desenvolvimento sustentável de todos os tipos de florestas. Um de seus destaques foi o fato de reconhecer o direito soberano dos Estados de usarem seus próprios recursos florestais, desde que essa exploração não causasse danos ambientais em outras áreas fora de suas jurisdições.
  • Agenda 21: Ela consiste em um plano de ação abrangente, destinado a ser implementado a nível global, nacional e local, com o apoio do Sistema das Nações Unidas, do governo e da sociedade civil. Ela contém 40 capítulos e 2500 recomendações em uma ampla gama de áreas, incluindo o combate à pobreza, a mudança nos padrões de consumo, a proteção e promoção da saúde humana e a gestão sustentável dos ecossistemas. Embora nem todas as suas recomendações tenham sido implementadas, ela estabeleceu um padrão de referência para a concretização do desenvolvimento sustentável.
  • Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima (UNFCCC): Ela foi estabelecida como um mecanismo para fomentar a cooperação internacional no combate à mudança climática. Com base nela, são realizadas periodicamente as Conferências das Partes (COPs), nas quais foram elaborados importantes tratados internacionais, como o Protocolo de Quioto (1997) e o Acordo de Paris (2015).
  • Convenção sobre Diversidade Biológica (CBD): Ela foi criada para promover ações sustentáveis em relação à vasta diversidade biológica do planeta, e também deu origem a uma série de COPs sobre essa temática.
  • Comissão sobre Desenvolvimento Sustentável: Após uma recomendação dada pela Agenda 21, esse órgão foi criado, também em 1992, pelo Conselho Econômico e Social das Nações Unidas (ECOSOC). Essa Comissão visava a permitir a participação de diversos tipos de atores (Estados, organizações internacionais, ONGs, etc.) nas discussões internacionais sobre o meio ambiente. Sua atribuição principal era monitorar a implementação das outras decisões obtidas na Rio-92.

O Legado da Rio-92

A Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento é considerada um dos eventos mais significativos na história das políticas ambientais globais. Sua importância e legado são vastos, porque refletem um momento no qual a comunidade internacional reconheceu a necessidade de integrar o desenvolvimento econômico com a sustentabilidade ambiental.

O legado da Rio-92 é extenso e multifacetado. Em primeiro lugar, pela primeira vez, uma definição oficial de desenvolvimento sustentável foi amplamente aceita e promovida. Esse conceito, na época considerado inovador, enfatizava que o desenvolvimento econômico não pode ocorrer à custa da degradação ambiental. Em segundo lugar, a Conferência reforçou a ideia de que a sociedade deve agir em conjunto (a nível local, nacional e global) para mitigar os impactos negativos sobre o meio ambiente. Em terceiro lugar, os documentos aprovados na Rio-92 deixaram claro que os países desenvolvidos deveriam ajudar os demais na transição para tecnologias mais limpas e na preservação das florestas — ainda que os financiamentos para isso nem sempre tenham sido cumpridos.

Além disso, a Rio-92 serviu como um catalisador para o desenvolvimento de várias convenções ambientais relevantes, como a Convenção das Nações Unidas para o Combate à Desertificação (1994), o Protocolo de Nagoya sobre Biodiversidade (2010) e o Acordo de Paris sobre a Mudança Climática (2015).

A conferência também abriu o caminho para futuros encontros internacionais sobre desenvolvimento sustentável, incluindo a Rio+10 em Joanesburgo em 2002 e a Rio+20 em 2012, no Rio de Janeiro. Esses eventos subsequentes focaram na renovação do compromisso com o desenvolvimento sustentável, atualizando e ampliando os debates e ações iniciados na Rio-92. Por exemplo, o documento “O Futuro que Queremos”, resultante da Rio+20, destacou a necessidade de uma economia verde, em prol do desenvolvimento sustentável.

Por fim, a Rio-92 influenciou a formulação, a reformulação e a implementação de políticas nacionais e locais voltadas para a sustentabilidade. Muitos países adotaram os princípios discutidos durante a Conferência, integrando-os em suas leis e fazendo com que vários setores se tornassem mais sustentáveis.

Em suma, a Rio-92 foi um marco na história da política ambiental global. As discussões nela foram capazes de unir o mundo em torno da ideia do desenvolvimento sustentável e de estabelecer um legado de princípios e normas ambientais que continua em expansão e evolução. Os resultados da Conferência refletem uma mudança significativa na forma como as questões de desenvolvimento e meio ambiente são tratadas no cenário mundial.

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