Em 21 de setembro de 2023, a chanceler da França, Catherine Colonna, discursou no Debate Geral da Assembleia Geral das Nações Unidas, em Nova York. Estes foram os principais pontos abordados em seu discurso:
- A Assembleia Geral é importante porque ela reflete a fé na cooperação e na confiança entre os países, no Direito e nos princípios comuns.
- A ação internacional da França é guiada pelos princípios das Nações Unidas desde o fim da Segunda Guerra Mundial, quando a França e a Alemanha conseguiram superar séculos de conflitos e aprenderam a ser amigas.
- A França defende muitos princípios: soberania, igualdade entre os estados, não agressão, integridade territorial, segurança alimentar, inviolabilidade do patrimônio histórico das nações e luta contra a impunidade.
- A anexação da Ucrânia contraria todos esses princípios. Ela tem sido feita “por meio de manobras vergonhosas e martirizando populações”, e tem sido condenada por amplas maiorias da Assembleia Geral. Ela ameaça não apenas o patrimônio histórico dos ucranianos, mas também os direitos humanos deles e a segurança alimentar do mundo como um todo. Os crimes de de guerra e os crimes contra a humanidade que ocorrem lá devem ser punidos pelo Tribunal Penal Internacional, caso contrário “haverá mais agressões, lá ou em outros lugares””.
- Os países têm um “dever de solidariedade”, e a França está fazendo a sua parte para ajudar os Estados mais vulneráveis do mundo. Ela aumentou sua ajuda alimentar a eles, ajudou a reestruturar suas dívidas e “superou suas promessas de financiamento climático em mais de um bilhão de euros”.
- A França defende os direitos humanos e estará sempre pronta para implementá-los, participando de operações de paz. Além disso, as próprias tropas de paz da ONU, que têm sido sequestradas, feridas e mortas, devem ser protegidas.
- Em termos de mudança climática, “a falta de ambição pode resultar em desastres” — isto é, os países devem unir-se e tomar ações coletivas imediatamente. A França acredita que acordos obrigatórios, como o Acordo de Paris e o Tratado do Alto-Mar, são o caminho para lidar com isso.
- O multilateralismo também é útil para lidar com crises internacionais. Em Nagorno-Karabakh, civis não podem ser submetidos a bloqueios e bombardeios. Na África, embora a França acredite em “soluções africanas para crises africanas”, ela ajuda organizações regionais sempre que possível — por exemplo, no Níger, no Sudão e na República Democrática do Congo. No Oriente Médio, a França favorece o “diálogo entre todos os países da região” e a existência de Israel e da Palestina como Estados independentes.
- A França apoia a reforma das Nações Unidas, incluindo a expansão do Conselho de Segurança, com uma ampliação dos membros africanos. Além disso, os franceses apoiam a reivindicação dos países do G4 (Brasil, Alemanha, Índia, Japão) para se tornarem membros permanentes.
Análise do Discurso
Na Cúpula da Assembleia Geral de 2023, Catherine Colonna apresentou os ideais da diplomacia francesa sob a presidência de Emmanuel Macron.
Assim como Joe Biden, Colonna teve palavras fortes sobre a “guerra de agressão” da Rússia e argumentou que ela infringia vários princípios internacionais. Foi interessante ver a conexão entre a guerra e os problemas no comércio de grãos — afinal, tanto a Rússia quanto a Ucrânia são grandes produtoras de grãos. No entanto, a maior crítica dirigida à Rússia foi que ela tem perpetrado “crimes de guerra e crimes contra a humanidade”. Para a França, ambos devem ser punidos pelo Tribunal Penal Internacional. Em março de 2023, esse Tribunal emitiu mandados de prisão contra Vladimir Putin e uma subordinada sua. Ao mencionar o TPI, a França pode estar endossando indiretamente o indiciamento de Putin.
No passado, a França era uma potência colonial e desenvolveu laços estreitos com países africanos que permanecem até hoje. Isso explica por que Colonna dedicou uma parte significativa de seu discurso às questões africanas. O continente enfrenta uma multiplicidade de golpes de estado e alguns países estão cada vez mais sobrecarregados por dívidas externas, sem falar do agravamento dos níveis de pobreza após a pandemia de Covid-19. Para enfrentar a deterioração das democracias africanas, a França propôs cooperar com organizações regionais (ou seja, evitar intervenções militares). Enquanto isso, prometeu fazer mais em termos econômicos: ajuda alimentar, reestruturação de dívidas e financiamento de projetos ambientais e de desenvolvimento.
Sendo membro permanente do Conselho de Segurança da ONU, qualquer coisa que a França diga sobre reformá-lo carrega muito peso. Os franceses não hesitam em afirmar que o Conselho tem sido ineficaz, porque membros como os EUA e a Rússia frequentemente vetam resoluções que vão contra seus interesses. Em uma aparente referência à Guerra Russo-Ucraniana, Catherine Colonna sugeriu criar regras sobre “o direito de veto em casos de atrocidades em massa”. Todavia, tal ideia bem-intencionada dificilmente seria aprovada pelos próprios países que exercem seus poderes de veto.
Em resumo, o que realmente importou no discurso da França foi sua condenação inequívoca da invasão da Ucrânia e seu foco em questões africanas, defendendo que o continente deve lidar com elas de forma autônoma.
Deixe um comentário